*Antes de começar esse texto, queremos informar que o livro a seguir trata de temas delicados que podem ser gatilhos para algumas pessoas, como ansiedade, depressão e suicídio. Se você ou alguém que você conhece está nessa situação, busque ajuda.
Informações técnicas
- Título Original: Dear Evan Hansen: The Novel
- Autores: Val Emmich, Steven Levenson, Benj Pasek e Justin Paul
- Tradução: Guilherme Miranda
- Editora: Seguinte
- Ano de Publicação: 2019
- Páginas: 336
Sinopse: Evan Hansen sempre teve muita dificuldade na hora de fazer amigos e de sociabilizar em geral. Para tentar mudar isso, decide finalmente seguir as recomendações de seu psicólogo e escrever cartas encorajadas para si mesmo, começando todas com o seguinte cabeçalho:
“Querido Evan Hansen,
Hoje vai ser um dia bom, e vou dizer por quê.”
O que ele não esperava era que uma das cartas fosse parar nas mãos de Connor Murphy, o aluno mais encrenqueiro da turma.
Quando Connor comete suicídio e sua família encontra a carta de Evan em seu bolso, todos começam a pensar que os dois eram melhores amigos. Sem conseguir explicar a situação, Evan acaba se enrolando mais e mais em uma grande mentira.
Opinião
É muito comum vermos livros adaptados para o cinema, teatro ou televisão. Porém, o caminho inverso é um pouco raro de ser encontrado. Em “Querido Evan Hansen” temos uma dessas raridades, o livro é uma adaptação do musical Dear Evan Hansen, encenado pela primeira vez nos palcos em 2015 e vencedor de seis Tony Awards, o Oscar do teatro, incluindo o prêmio de Melhor Musical.
Normalmente eu torço o nariz para esse tipo de adaptação porque sempre acho que vão simplesmente pegar o roteiro da obra original e dar apenas uma romanceada, mas ainda bem que eu resolvi dar uma chance para Querido Evan Hansen. O livro traz novos tons para a história de Evan e Connor e é belíssima a forma como os autores conseguiram transpor as músicas para o texto.
Essa mudança do teatro musical para a literatura também já ajuda a entender a quantidade de autores creditados na capa do livro. Benj Pasek, Justin Paul e Steven Levenson são os criadores da história e das músicas do espetáculo original, enquanto Val Emmich foi o responsável por recontar essa história no formato de livro.
Mas voltando a obra, aqui conhecemos a história de Evan, um garoto que está no seu último ano do ensino médio e que quer apenas passar pelos seus dias sem grandes problemas. Ele sofre de ansiedade e depressão e tem grandes dificuldades em interações sociais, até mesmo um “oi, tudo bem?” é capaz de deixá-lo extremamente desconfortável e com as mãos molhadas de tanto suor.
Evan não tem amigos, ele passa os seus dias enfiado no próprio quarto e tenta escrever cartas positivas para si mesmo, uma tarefa que lhe foi passada pelo seu psicólogo e que ele executa com grande dificuldade. Tentar se manter positivo é uma tarefa difícil.
Apesar de tudo isso, ele ama a natureza, tem uma leve obsessão por árvores e sonha em fazer muitas trilhas ao redor dos Estados Unidos. Esse amor pela natureza fez com que Evan arrumasse um emprego de aprendiz de guarda florestal no último verão.
Um dia no trabalho Evan avista um lindo carvalho e ele decide subir na árvore, cada vez mais alto e mais alto, até o topo. A vista de lá é linda e Evan sente o sol no seu rosto, ele nunca se sentiu tão em paz, até que o galho cede e ele cai, garantindo um braço quebrado.
O gesso completamente em branco em seu braço se abre como uma oportunidade de se aproximar das pessoas, quem sabe Evan consegue uma assinatura ou outra na escola na volta às aulas? Quem sabe ele não consegue se aproximar de Zoe, sua paixonite secreta?
Mesmo com todos os esforços, Evan tem um péssimo dia na escola. Ele não consegue se aproximar das pessoas, ninguém assina o seu gesso e ele se envolve em uma confusão com Connor, o irmão problemático de Zoe. Ele termina o dia no laboratório de informática escrevendo uma de suas cartas mais pessimistas até então.
“Querido Evan Hansen(…) Queria que tudo fosse diferente. Queria fazer parte de alguma coisa. Queria que alguma coisa que eu digo fosse importante, para quem quer que seja. Sério: alguém perceberia se eu desaparecesse amanhã?”
Enquanto imprime a sua carta, temos o ponto de virada na história de Evan. A carta vai parar nas mãos de Connor por acidente e Evan não consegue explicar sobre o que se trata. No dia seguinte ele descobre que Connor cometeu suicídio e sua carta é confundida com a carta de despedida de Connor, endereçada a Evan.
Sabe quando uma pequena mentira acaba gerando um turbilhão de outras mentiras e você simplesmente não consegue mais se livrar daquela situação? Essa é a história de Evan.
Um garoto que sempre se sentiu invisível de repente é parte de uma história, de uma narrativa, de uma amizade secreta com alguém, ele é visto por todos.
Evan se torna o porta voz da história de Connor, ele inventa e-mails, momentos que passaram juntos, confissões trocadas. Ele se torna incapaz de desmentir tudo por medo de machucar ainda mais as pessoas.
Ele se envolve com a família de Connor, trazendo o lado de um filho que eles não conheciam, de repente Evan se torna popular e todos querem saber mais sobre ele, até mesmo Zoe está interessada.
Durante a leitura é muito fácil julgar Evan e não entender porque ele conta cada vez mais mentiras, mas basta um exercício de empatia para perceber que a situação vai muito além de certo ou errado. O mal entendido inicial que se transformou em uma grande mentira mudou a vida de Evan, mas quais estragos a verdade poderia causar para alguém que já sofre com tantas outras questões?
Permeado por essa situação o leitor é sugado para um livro vira páginas onde fica cada vez mais interessante ler sobre os desdobramentos da história de Evan.
O livro também tem seus pontos positivos em se diferenciar do musical, com capítulos alternados entre a visão de Evan e de Connor sobre a situação, apresentando personagens novos e que dão um novo significado para a história sem fugir da essência original.
Outro ponto positivo é a forma como Val Emmich conseguiu transpor as músicas para a narrativa de um forma tão natural e fluida, tornando até divertida a missão de identificar qual passagem do livro representa qual música do espetáculo.
O livro apresenta personagens reais, com falhas e completamente humanos. É possível sentir a ansiedade e desespero de Evan em muitos momentos, além da dor de Connor em não saber lidar com seus problemas e sua solidão. Ao mesmo passo em que temos personagens que estão até mesmo se questionando se devem sentir a dor da perda por uma pessoa que nem conheciam direito.
Outra personagem que merece destaque é a mãe de Evan, Heidi, uma mãe solteira que faz tudo que está ao seu alcance para ter uma boa relação com o filho mas que é atropelada pela necessidade de trabalhar e nem sempre pode estar presente.
Também temos personagens divertidos e que ajudam a trazer certa leveza ao livro como o “amigo da família”, Jared, que funciona como uma espécie de consultor tecnológico no plano de Evan.
Em resumo, apesar de trazer temas sérios como depressão, ansiedade e perda, “Querido Evan Hansen” não é irresponsável nessa tratativa, mostrando que é necessário buscar ajuda e que ninguém deve passar por esse tipo de situação sozinho ou se sentir invisível e abandonado.
Não vou trazer spoilers sobre o andamento da narrativa, mas posso dizer que o final do livro é satisfatório e condiz com a trama apresentada, os autores se mantém com o pé no chão e não tentam livrar o protagonista de enfrentar os seus erros.
Por fim, eu realmente recomendo a leitura, especialmente se você já é um fã do musical original ou se está buscando um livro que trata de temas densos sem pesar a mão. Na minha nota final, o livro fica com 4 estrelas.
Vale lembrar que a história está em processo de adaptação para os cinemas e já conta com Amy Adams, Amandla Stenberg, Nik Dodani e Ben Platt no elenco.
Gostou da nossa resenha? Então bora ouvir a trilha do musical pra acompanhar nessa leitura e não esqueça de compartilhar com seus amigos.
Até mais!
Se você precisa de ajuda:
Centro de Valorização da Vida (CVV)
Telefone: 188
Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (Abrata)
Telefone: (11) 3256-4831
Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio (Abeps)
Fênix – Associação Pró Saúde Mental
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